terça-feira, novembro 15, 2005

O insustentável peso da saudade

- Porque é que não me beijas?
- Desculpe?! O que é que isso interessa para o caso?
- Estás doido? "We're in the middle of something here..." Só podes estar a gozar.
- Cale-se e continue...
- Quê? Que coisa mais machista!
- Sabe onde é a porta, não sabe?
- Estás a mandar-me embora???
- Não, mas não tenho paciência para desaforos e devaneios psicológicos dos 40 anos. Não tenho mulher efectiva, não me interessa ter e todas as relações, ou espécie que tenha, serão sempre assim. Se está à espera de mais, lamento, mas nada tenho para lhe oferecer. Nunca lhe fiz promessas, nunca lhe dei garantias. Entenda-me como um desvio à norma, um escape do quotidiano. Não alguém que lhe amparará as quedas.
- Como é que podes dizer isso? Como é que podes ser tão... sei lá...as mulheres não são objectos!! Nunca me beijaste, isso é muito estranho. Fazemos amor sem beijos. Tu não és normal!
- Até amanhã.
- O quê?
(ele levanta-se da cama, enrola a manta à cintura e agarra a maçaneta da porta.)
- Não tenho mais tempo. Tenho que trabalhar.

Beijar alguém é algo que se tornou tão vulgar como beber um copo de água à refeição. Mesmo que não tenhamos sede, há sempre um copo e um jarro. E eu não quero isso para ti, por respeito ao nosso Amor e à grande presença que ainda fazes exercer sobre o meu mundo.
Nunca consegui beijar uma única mulher desde que me deixaste. Tu foste para mim a única detentora do meu verdadeiro ser. E é tão diferente partilhar o corpo de partilhar uns lábios. Os meus serão só teus, teus para sempre. O meu corpo, esse é um bocadinho de todas aquelas com quem já o partilhei. Não sinto que isso seja uma traição à tua pessoa. Não será com certeza, mas tu és mulher e vocês têm uma maneira estranha de pensar e, sobretudo, de sentir.
Estar com outra pessoa é muito diferente agora. É como não estar lá, a minha alma sai de mim e refugia-se nas tuas memórias. É apenas físico. Entendes-me?
Não vejo qualquer mal nisso. Ao fim e ao cabo, nessas alturas estou ainda mais perto de ti. Consigo tocar-te ao de leve nos cabelos e cheirar o teu pescoço. A minha vida desaparece nos teus olhos e ali, naquele momento, não sou nada. De repente, alguém pergunta qualquer coisa como "foi bom?". E é o momento de voltar à terra, de te deixar repousar à minha espera, de levantar-me e abrir a porta do quarto, "Adeus e até outro dia", digo eu.
E elas vão embora e eu sento-me aqui a escrever para ti.

"Como se não houvera,
bosque mais secreto,
como se as nascentes fossem só ardor,
como se o teu corpo,
FORA A VIDA TODA (...)" Eugénio de Andrade

1 Comments:

Blogger Unknown said...

em 20 palavras....MT BOM....curti mm ;_;

11/16/2005 09:06:00 da tarde

 

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